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Postado em 26/06/2012 - 8:09
20 mil léguas fictícias-Entrevista com Alastair Reynolds
Nina Gazire

O astrônomo e escritor fala sobre a questão da água na ficção científica e em sua obra

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Foto: Barbara Bella

Alastair Reynolds é um dos grandes nomes da ficção científica britânica. Ele é especialista no gênero hard sci-fi, um estilo caracterizado por trazer para as histórias um extremo rigor científico e teórico. A justificativa para o apuro técnico de Reynolds no que tange as teorias científicas presentes em suas obras está no fato de que, antes de se tornar um escritor profissional, ele trabalhou no European Space Research and Technology Centre _um dos maiores centros de pesquisa e astronomia da Europa. Astronômo de formação, em seus livros mais recentes, ainda não publicados no Brasil, o escritor aborda a questão da água e o inevitável destino das explorações espaciais como alternativa para a busca de recursos naturais. Em entrevista para seLecT _ feita especialmente para a matéria 20 Mil léguas fictícias, que faz uma investigação sobre a presença da questão da água na ficção científica_ Reynolds fala sobre seu fascínio pelos mares e de como vê um futuro positivo para o continente africano.

Você tem especialização em física e astronomia e também trabalhou no European Space Research and Technology Centre (Centro europeu de pesquisa espacial e tecnologia). Quando e por que você decidiu se tornar um escritor de ficção científica? Como você concilia as duas carreiras?

Eu tenho tentado escrever ficção científica durante grande parte da minha vida – isso começou muito antes da minha carreira. Eu comecei a publicar como escritor ao mesmo tempo que tentava o meu doutorado. Mais tarde cheguei a um ponto onde estava difícil equilibrar as exigências, tanto do dia a dia quanto na criação de minhas novelas. Então decidi me tornar um escritor em tempo integral. Mas eu nunca perdi meu carinho pela ciência, e ainda tenho a sorte de ter amigos e colegas que estão prontos para me receber de volta se for o caso.

A questão da água sempre esteve presente na literatura fantástica ou de ficção científica de alguma maneira. Já que em seus livros mais recentes você trabalhou com este tema, de que maneira os mundos aquáticos do passado, presentes na ficção científica, influenciaram na sua escrita?

O mar sempre esteve presente na FC, e nunca deixou de ser um elemento protagonista no gênero. Eu cresci com programas de TV como Boy Marine (uma animação japonêsa desconhecida), a série feita com bonecos como Stingray e Thunderbirds, ambas passadas em ambientes futuristas subaquáticos. Cresci lendo Arthur C. Clarke, um dos grandes mestres do gênero e que de tempos e tempos sempre usa os mares como pano de fundo para as suas histórias. Acredito que podemos aprender muito sobre o planeta Terra ainda e também que o mesmo impulso exploratório presente naqueles que estudam os oceanos, está naqueles que estudam as estrelas.

Na sua mais série de livros, Poseidon’s Children (Filhos de Poseidon- livro ainda sem tradução para o português), você retrata um continente africano rico e poderoso, muito diferente do que estamos costumados a ver. Você acha que este cenário um dia será possível? Como o livro se relaciona com a questão da água?

Meu interesse pela África como pano de fundo para o livro veio da música: sou um grande fã de muitos músicos africanos, especialmente aqueles de Mali, que não é o lugar onde as histórias do meu livro são passadas, mas digamos que este país é a gênese de toda a minha fascinação pelo continente. Eu queria escrever um romance sobre a colonização do espaço e sobre e a idéia de fazer da África uma potência econômica e tecnológica como o centro disso é muito atraente. Me surpreendem as pessoas que dizem que isso não é possível. É uma uma mentalidade leviana. Sobre a relação com a água, o título da série_ já que Poseidon é o deus dos mares na mitologia grega_ é uma reflexão sobre o fato de que os personagens são pessoas que sobreviveram a inundações e tempestades – em outras palavras, eles sobreviveram há muitas catástrofes climáticas ocorridas ao longo do século 21, já que a história se passa no século seguinte.

Você vê um futuro seguro para o planeta? Como você lida com essas questões em sua produção?

Eu sou extremamente otimista, mas há um porém. Eu estou pensando a longo prazo, para muito além dealgumas décadas. Dependendo da sabedoria dos políticos e das tomadas de decisões, poderemos atravessar momentos muito difíceis – como, aliás, centenas de milhões de pessoas já estão experimentando em todo o mundo. Mas, a longo prazo eu estou esperançoso de que o bom senso vá prevalecer. Como escritor, tenho o otimismo como minha configuração padrão, mas o otimismo pode significar muitas coisas diferentes para pessoas diferentes. O cenário esperançoso de uma pessoa pode ser o pesadelo para outra. E afinal de contas estou escrevendo ficção. Meu livro mais recente da série Poseidon’s Children, Remembered Blue Earth (Relembrando a Terra Azul) é bastante utópico em muitos aspectos, mas os resultados futuros, que são definidos alguns séculos mais tarde, são um pouco mais soturnos – como o movimento médio de uma sinfonia.

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