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Postado em 03/02/2016 - 3:46
Afogando em números
Depois de décadas de teorias e ativismos, a maioria esmagadora de profissionais do mundo da arte continua sendo “branca, euro-americana, heterossexual, privilegiada e, acima de tudo, masculina”. Confira o editorial da seLecT 28, dedicada ao feminismo
Paula Alzugaray

Uma pesquisa realizada pela ArtNews, em meados de 2015, concluiu que, depois de décadas de teorias e ativismos feministas, pós-colonialistas, antirracistas e queer, a maioria esmagadora de profissionais do mundo da arte continua sendo “branca, euro-americana, heterossexual, privilegiada e, acima de tudo, masculina”.

Segundo a publicação norte-americana, a discriminação sofrida por mulheres é reincidente em todas as esferas: representação em galerias, cotações de preços em leilões, cobertura da imprensa, inclusão em coleções, porcentagem em grandes mostras coletivas, como a Bienal de Veneza e a Documenta, e exposições individuais em grandes instituições. Os números são exatos: artistas mulheres são brindadas com menos de 30% das exposições individuais nos principais museus dos Estados Unidos; elas são apenas três em cada dez artistas representados em galerias comerciais dos Estados Unidos.

Um levantamento da seção Mundo Codificado desta edição de seLecT, reunindo dados de instituições brasileiras e internacionais sobre a participação feminina em acervos e entre os cargos de curador e diretor, atesta que o Brasil está longe de ser pioneiro na reversão dessa tendência. Convidamos o nosso leitor a constatar no infográfico do Mundo Codificado que, nos acervos das instituições pesquisadas do Rio de Janeiro e São Paulo, a disparidade é gritante. Embora, na maioria dos casos, as mulheres se sobressaiam nos cargos executivos (55%, 58% ou 65% contra 30% em um caso), elas não ocupam o de direção. A exceção, até o fechamento desta edição, era Katia Canton, que em janeiro assumiu interinamente o comando do MAC-USP, após a renúncia do diretor Hugo Hasegawa, em novembro passado.

Em entrevista a Márion Strecker, a crítica Lisette Lagnado, que foi curadora-geral da 27ª Bienal de São Paulo, em 2006, afirma que o evento paulistano apresenta um padrão histórico de presença de dois terços de homens ante um terço de mulheres. Estes já seriam motivos suficientes para justificar uma edição de seLecT inteiramente dedicada ao feminismo, não fossem os dados acima ofuscados por atentados ainda mais graves e intoleráveis contra a integridade e os direitos da mulher brasileira.

Dedicamos esta edição às diretoras (enquanto produzíamos a edição, tivemos a boa notícia de que a Tate Modern anunciou a primeira mulher a assumir o mais alto cargo do importante museu britânico), às executivas, às aprendizes. Às professoras e alunas. Às mães, trabalhadoras e ativistas. Às pioneiras. Mais que tudo, às aventureiras. Como Cris Carvalho, ex-atleta de elite, ex-diretora- técnica do Projeto Mulher e do Núcleo Aventura, pioneira das corridas de aventura no Brasil.

Porque aventura é o que nos move.

*Texto originalmente publicado na #select28

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feminismo   select 28