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Postado em 24/05/2013 - 6:26
Museu da cidade
Paula Alzugaray

Em exposição individual, Jaime Prades parte de um impulso acumulativo para chegar a um pensamento sintético sobre a relação entre o homem, a cultura e a natureza

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Legenda: Instalação Ar, feita com escapamentos de carros e carvão vegetal Fotos: Jaime Prades/Divulgação

Diz a lenda e conta o artista Jaime Prades que o Tupinãodá foi o primeiro coletivo de arte urbana do Brasil. Quando participou da fase mais ativa do grupo, entre 1984 e 1989, Prades bebia das fontes da antropofagia modernista, das performances de Flávio de Carvalho e das intervenções urbanas de Alex Vallauri – artista atualmente revisitado em retrospectiva no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Naquele momento, Prades criou a série “As Máquinas”, mural de proporções monumentais que, num belo dia de 1987, surgiu em uma das paredes do túnel da avenida Paulista e acabou impactando sobre várias gerações de artistas urbanos. Parte dessa história está contada no percurso de obras expostas em “Osso”, no Espaço Cultural Instituto Cervantes, em São Paulo. Porém, mais que um recorte de momentos significativos de seus 30 anos de trabalho, a exposição abre novo ciclo na obra de Jaime Prades. “Fiquei muitos anos preso ao desenho, mas hoje me descubro um escultor”, diz o artista.

A exposição divide-se, portanto, em dois tempos. A primeira sala exibe uma série de obras recentes que ostentam duas intenções de trabalho: o acúmulo e a síntese. A instalação “Terra, Ar, água, Fogo” é constituída por três totens compostos de acúmulo de matérias orgânicas (minerais) e objetos descartados. “Terra” é feito de antigas portas e janelas, encontradas em demolições, organizadas sobre um monte de terra; “Ar” é feito de um agrupamento de escapamentos de carro descartados, sobre um monte de carvão vegetal; e “Água” é feito de galões de água mineral sobre um monte de areia. “Essa instalação evoca a memória dos materiais e das vidas que passaram por eles. São objetos impregnados de humanidade”, diz Jaime Prades.

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Legenda: Obras da série Ossário articulam objetos descartados Fotos: Jaime Prades/Divulgação

Diante dos totens feitos de acúmulo, uma parede recebe sete objetos construídos com um sentido muito apurado de síntese. A série  Ossário articula objetos achados na rua, de forma a construir frases e pensamentos. Assim, dois talheres associados a um osso de boi e uma pá enferrujada, por exemplo, constroem a ideia de um ciclo de cultivo e nutrição – ou nascimento, vida e morte. Outros objetos chegam a expressar uma vontade de catalogar, indexar ou diagramar os elementos, como se construíssem um arquivo iconográfico da vida urbana. A síntese é, portanto, a tônica preponderante.

“O osso é o que fica”, afirma ele, referindo-se ao elemento que dá título à exposição. O segundo tempo da mostra é composto por obras realizadas desde os anos 1980. Estão ali telas que representam personagens que emergem do lixo e telas cobertas por uma malha de inscrições que cobriram também os muros de São Paulo. Nessas caligrafias, encontramos a mesma propensão ao pensamento sintético com que o artista faz sua escultura recente. A exposição se desenha, portanto, como uma arqueologia da própria obra de Jaime Prades.

Osso – Jaime Prades, até 08/06
Espaço Cultural Instituto Cervantes,
São Paulo