icon-plus
Sarah Morris, still de Rio, 2012 (Foto: Cortesia Petzel Gallery)
Postado em 05/04/2016 - 4:06
Olhar estrangeiro
Distante do registro exótico do passado, Rio de Janeiro surge como matéria-prima para filme de Sarah Morris
Camila Régis

Poucas coisas parecem mais incongruentes do que o desfile das campeãs sem samba-enredo. É com uma trilha sonora obscura, assinada por Liam Gillick, que o filme Rio (89 minutos, 2012), da anglo-americana Sarah Morris, retrata o Sambódromo da Marquês de Sapucaí em seu dia de glória.  A partir de elementos enraizados no imaginário carioca — e brasileiro — como carnaval, cafés de boteco e estádios de futebol, a artista traz um olhar estrangeiro distinto do que costuma recair sobre o Rio, mostrando um contexto estranhamente recente.

Apesar de classificar seu trabalho como uma “autorreflexão narcisista”, que não representa o espaço que lhe serviu de inspiração, como disse em entrevista, Morris evidencia as profundas contradições que marcam urbanidade local. Com um olhar de flâneur que capta impressões da cidade, a câmera flagra, em especial, a arquitetura (Oscar Niemeyer é um dos entrevistados do vídeo) e  vai criando uma narrativa dedicada à visualidade carioca. O estalo inicial para criar o trabalho surgiu quando Morris entrou em contato com It’s All True (1942), documentário inacabado em que Orson Welles retrata, entre outras coisas, o carnaval. 

Com nativos e visitantes se deslocando pelos cenários, o filme é uma colagem audiovisual que ficcionaliza a paisagem mais simbólica do país. O mesmo ocorreu com Los Angeles, Las Vegas e Beijing, cidades apresentadas em outros vídeos da artista que trazem a metrópole como eixo principal“Depois de trabalhar com as corporações em Los Angeles que decidi abordar o espetáculo em nível de Estado. O que acontece quando você coloca o capitalismo como uma forma de totalitarismo e como isso se apresenta visualmente”, comenta.

Ao ver de fora a paisagem prosaica carioca, Morris foca em detalhes para revelar nuances de sistemas de poder e como isso reflete visualmente na cultura. “Como as estruturas que descrevo, meu trabalho está em constante movimento. Ele se relaciona com poder: o poder está sempre em fluxo, não resolvido e pronto para ser agarrado. Esse é um dos aspectos mais importantes de todos os meus filmes. Uma instituição pode ser ótima ou horrível, interessante ou insidiosa. Depende de quem a lidera”, conta a artista.