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Foto de Sonia Guggisberg de contêineres de refugiados em Atenas, 2015 (Cortesia da artista)
Postado em 05/08/2016 - 3:46
#somostodosimigrantes
Imigrantes e fluxos migratórios são protagonistas da seLecT 31, que chega a partir de 9/8 nas bancas
Paula Alzugaray

Quando ganham força no mundo os discursos separatistas e fundamentalistas, seLecT dedica sua 31ª edição a afirmar a arte contemporânea como frente de resistência a todas as formas de exclusão.

Quando o futuro é transformado em medo e ameaça, cabe ressaltar a coragem de uma Bienal de São Paulo que se dedica a uma certa “Incerteza Viva”, trazendo artistas que falam de deslocamento e desestabilização. “Se há razão para temer as incertezas, haverá outras tantas razões para temer a certeza”, escreve Mia Couto em ensaio inédito para o catálogo de processos artísticos e pedagógicos da 32a Bienal. “Porque, afinal, a certeza pode excluir, pode afastar-nos da complexidade e diversidade do mundo, pode criar uma falsa sensação de segurança e de superioridade racional e moral.”

Nesta edição, apontamos para a centralidade que os fluxos migratórios assumem entre os artistas que investigam criticamente situações políticas, sociais e econômicas da vida contemporânea. A editora Márion Strecker identifica como as diásporas e trocas de saberes aparecem nos processos de trabalho de 12 artistas convidados para a 32a Bienal. A repórter Luciana Pareja Norbiato traz relatos de artistas que se deslocaram para campos de refugiados. Trabalhando e expondo nas fronteiras, Sonia Guggisberg, Javier Téllez, Annette Messager e Olafur Eliason lançam luz sobre a maior crise migratória da história.

A seção Fogo Cruzado dá voz aos imigrantes, que responderam negativamente à espinhosa pergunta: “O brasileiro está aberto para receber refugiados e imigrantes?” O artista colombiano Carlos Monroy, residente em São Paulo, é categórico: “O isolamento cultural das comunidades nordestinas, bolivianas e haitianas nos dá a ideia de que, talvez, o brasileiro não curta muito o imigrante índio e o refugiado preto, mas se orgulha de levar o sangue do imigrante italiano”.

A problemática denunciada por Monroy é a pauta escolhida pela historiadora e crítica Daniela Bousso na curadoria desenvolvida para seLecT. Ela própria imigrante, investiga com propriedade as poéticas de matriz afrodescendente que abordam as novas diásporas do século 21. Nascida no Egito, de família judia, Bousso teve de deixar o país natal aos 9 meses de idade, em movimento migratório decorrente da Guerra do Canal de Suez, em 1956. “Viemos de navio, em uma viagem que durava três meses, portando um carimbo de apátrida em nossos documentos”, conta Bousso à seLecT. “Fiquei com o carimbo na minha carteira de identidade até os 18 anos, quando pude “jurar bandeira” e me tornar, finalmente, brasileira. Esta é mais uma das histórias de imigração forçada no contexto dos conflitos entre Israel e Palestina.”

A zona de exclusão e o esfacelamento de um território que, no imaginário coletivo global, é sinônimo de usurpação e ódio, a Palestina e sua Faixa de Gaza são revisados por Giselle Beiguelman em ensaio visual com imagens desoladoras de seis “Palestinas brasileiras”, extraídas do Google Street View.

Por fim, no quadro multiterritorial da seLecT, temos a satisfação de introduzir nosso designer, Saul Sales, que empresta o ar solar de Fortaleza (CE) à redação, e a repórter online, Ana Abril, espanhola com atuação voluntária no movimento pelos direitos dos migrantes e autora da reportagem sobre políticas migratórias, discutidas no Fórum Social Mundial das Migrações (FSMM), em julho, em São Paulo.