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Postado em 27/05/2013 - 2:23
Batismo de sangue
Paula Alzugaray

Exposição da arte produzida durante a guerra civil na Colômbia fica em cartaz na Casa Daros, no Rio, até setembro

Colombia

Conta Juan Manuel Echavarría que há 50 anos a Colômbia vive ciclos contínuos de violência e inócuas tentativas de acordos de paz. “Os políticos nos saturaram com as palavras paz e guerra e elas acabaram perdendo seu significado.” A partir da constatação, Echavarría empenhou-se em ensinar as palavras a dois papagaios, que levaram oito meses para aprender a falar “guerra e pa”, pois um deles comeu o som de “s” de paz. “A partir da mutilação dessa palavra, compreendi que a paz é um conceito incompleto na humanidade. O acidente me ajudou a conceituar a obra”, contou Echavarría diante do vídeo Guerra y Pa (2011), exposto em Cantos Cuentos Colombianos, a exposição que marca a abertura da Casa Daros, no Rio de Janeiro.

Tomadas literalmente, duas obras poderiam ter nomeado a exposição: a instalação sonora Vesper (2000), de Oswaldo Macià, que reúne 55 narrativas em sete idiomas das lembranças felizes de mulheres caribenhas, e Bocas de Ceniza (2002), de Echevarría, retratos videográficos de narrativas cantadas por sobreviventes de massacres e situações de violência na Colômbia. Mas assim como Echevarría e Macià, a maioria dos artistas de Cantos Cuentos Colombianos constrói suas obras a partir de narrativas e do reprocessamento da vivência da violência.
A título de introdução – ou prólogo – da história da guerra civil colombiana que será contada por dez dos mais ativos e politizados artistas do país, Fernando Arias apresenta Caixão de Lego – Homenagem às Crianças da Guerra das Drogas (2000). Entende-se, logo na entrada da exposição, no vasto lobby do impressionante e respeitável edifício, que a Casa Daros opta por um batismo de sangue. As obras em exposição, um recorte da totalidade de 1.200 obras de 117 artistas da coleção Daros Latinamerica, foram feitas nos anos 1990, sob a guerra civil na Colômbia, explica o curador Hans-Michael Herzog, diretor artístico da coleção. E essa escolha aponta para a seriedade com que a instituição pretende trabalhar as questões da vida política e social na América Latina.

Embora pontual, um pouco de humor também se faz notar. E é muito bem-vindo. Trata-se da série de peças arqueológicas manipuladas de Nadín Ospina, um conjunto de esculturas manufaturadas em cerâmica, pedra e metal banhado em ouro, pelas mãos de um falsificador profissional contratado pelo artista. Só que, em vez da iconografia pré-colombiana, nos deparamos com uma imagética pós-Walt Disney World. Colonialismo, narcotráfico, falsificação, corrupção, morte. Bem-vinda Casa Daros, que nos brinda com informações contundentes sobre os nossos vizinhos.

Cantos Cuentos Colombianos

até 8 de setembro
Casa Daros

Rua General Severiano, 159, Rio de Janeiro

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* Publicado originalmente na edição impressa #11