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Montagem de ILUSÃO (2020), de Vitoria Cribb, na mostra Por Detrás da Retina, no Centro Cultural Inclusartiz [Fotos: Divulgação]
Postado em 12/09/2022 - 12:02
Caminhos que se cruzam
Nos 25 anos do Inclusartiz, Frances Reynolds anuncia Victor Gorgulho como curador chefe, intensifica metas ambientais e ações no interior do Brasil

“Meu sonho é ter satélites do Inclusartiz no Brasil todo”, diz Frances Reynolds, ao contar a viagem de pesquisa que realizou pela região centro-oeste para conectar os projetos do instituto com o contexto artístico local. “O que mais amo é pesquisar o Brasil. Tanta riqueza intelectual ainda a descobrir. Ontem mesmo conheci um filosofo da Bahia, Agostinho da Silva. A primeira coisa que vou fazer hoje é comprar o livro dele”, diz ela, em entrevista à seLecT. 

Frances Reynolds na abertura da exposição Gamboa: Nossos Caminhos Não se Cruzaram Por Acaso [Foto: Divulgação]
Frances Reynolds chegou no Rio, nos anos 1990, vinda de Nova York, onde foi presidente da Warner Brothers para a América Latina. O primeiro lugar em que se sentiu em casa foi a Escola de Artes Visuais do Parque Lage, onde teve aulas com artistas como Beatriz Milhazes, fez amizades e conheceu Paulo Herkenhoff, a quem credita mentoria intelectual e conceitual do Instituto Inclusartiz, seu projeto de vida. 

Victor Gorgulho, no Centro Cultural da Gamboa [Foto: Ivan Nishitani]
Desde a criação do Instituto Inclusartiz, há 25 anos, a colecionadora incorporou um papel de embaixadora da arte e dos artistas brasileiros, o que realiza até hoje com cada vez mais entusiasmo e foco. Começou criando uma ponte aérea artística Brasil-Espanha, abrindo um circuito de intercâmbios entre organizações e agentes culturais brasileiros e de outros países. Depois, iniciou o projeto de residências, convidando artistas, curadores e pesquisadores estrangeiros para conhecer o circuito de arte nacional. No sentido inverso – artista brasileiros em residências internacionais –, não demorou a perceber a concentração de oportunidades no eixo Rio-SP. “Conversei com Paulo [Herkenhoff]: ‘como podemos dar essa oportunidade ao país todo?’. Ele disse: ‘divida o país em regiões’”.

Frances Reynolds e Talles Lopes na Delfina Foundation [Foto: Divulgação]
BRASIL AFORA
Há quatro anos, os curadores do Inclusartiz enfocam diferentes regiões do Brasil em seus editais para residências internacionais em parceria com a Delfina Foundation, de Londres. Em 2021, o goiano Talles Lopes foi o selecionado na chamada aberta; em 2020, foi a vez de Manauara Clandestina, do Amazonas; em 2022, o foco é a região Sul, para uma residência de três meses entre janeiro e março de 2023. “Para todo o processo de seleção relacionado à arte contemporânea, me parece muito importante a atenção em projetos que tensionem ou que de alguma forma estejam conectados com as questões urgentes do tempo presente, do momento em que estamos vivendo”, conta Ana Rocha, jurada de Santa Catarina para o processo seletivo da região Sul. 

Cada vez mais interessada em projetos de educação ambiental e sustentabilidade social, a equipe do instituto intensifica os projetos em territórios pouco visibilizados. “Todo mundo pensa que o Centro-Oeste é só soja e mineração, mas há uma nova geração de artistas incríveis em toda a região”, diz Frances. A valorização de projetos artísticos que favorecem a conscientização ambiental é outra prioridade. Como o projeto realizado pela artista Marcela Cantuária com artistas de murais e organizações de defesa dos manguezais da cidade de Cajueiro da Praia, Piauí, chamando a atenção para a preservação do peixe-boi. 

“Tive uma troca com a comunidade, fui conhecendo todos muito rápido, pescadores, marisqueiras, as crianças do lugar. Temos esse eixo ambientalista, a nossa grande estrela é o peixe-boi, mas também falamos dos nativos, os índios tremembés, as tradições, como a celebração de Santa Adelaide, uma santa não canonizada, e das casas tradicionais’, relata Marcela Cantuária. 

Fotoperformance Que Ficção Vocês Construíram Pra Meu Corpo (2018), de Laryssa Machada [Foto: Divulgação]
CORAÇÃO DO RIO
O mesmo foco é dedicado ao bairro da Gamboa, do Rio de Janeiro, onde fica a sede do Centro Cultural Inclusartiz. “Inclusartiz é uma plataforma de dialogo entre países e comunidades. Quando chegamos à Gamboa, fizemos vários encontros com a comunidade, para escuta-los, saber o que era importante pra eles”, diz Reynolds. O processo de escuta gerou Gamboa: Nossos Caminhos Não se Cruzaram Por Acaso, curadoria de Lucas Albuquerque, com obras de 25 artistas e coletivos do bairro, em cartaz até 31/7. O título mostra foi inspirada num manuscrito de Tia Lúcia (1942-2018), pintora, escultora e moradora do Morro do Pinto e sua realização uma homenagem dos talentos da região que, historicamente, incluem Heitor dos Prazeres (1898-1966). A elaboração de um mapa do circuito de arte e ateliês da região portuária é a próxima etapa do projeto.

Montagem da obra de Adriana Varejão, em cartaz na mostra Por Detrás da Retina, no Centro Cultural Inclusartiz [Foto: Divulgação]
Refletir a diversidade cultural do Brasil e expandir a atuação do instituto dentro e fora da Gamboa são as missões do novo curador-chefe do instituto, o jornalista e pesquisador Victor Gorgulho. Ele faz sua estreia oficial no cargo na quinta 15/9, com a exposição Por Detrás da Retina, coletiva com trabalhos de 14 artistas brasileiros contemporâneos, cujas obras investigam, por meio de variados suportes, as relações entre o espaço físico e a virtualidade, buscando instaurar territórios que extrapolam a capacidade convencional da visão humana. Entre os artistas apresentados, Laryssa Machada, Rodolpho Parigi, Adriana Varejão e Vitoria Cribb, cuja obra foi tema de um portfolio na revista seLecT Algoritmo, em setembro de 2020. Em 2023, a vasta pesquisa do instituto sobre as regiões brasileiras será materializada em um projeto sobre arte popular. 

Por detrás da retina
Curadoria de Victor Gorgulho, de 15/9 a 11/12
Centro Cultural Inclusartiz – Rua Sacadura Cabral, 333, Gamboa, Rio de Janeiro
Visitação: quinta-feira a domingo, das 11h às 18h
Entrada gratuita.