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Arlindo Machado (Foto: Reprodução)
Postado em 31/07/2020 - 1:47
Cinememória
Arlindo Machado entre nós
Paula Alzugaray e Giselle Beiguelman

Há uma semana, perdemos Arlindo Machado. Professor da PUC-SP, onde fez história no Programa de pós-graduação em Comunicação e Semiótica, e da ECA-USP, Arlindo foi também crítico e curador especializado em artemídia, termo que ele consolidou entre nós.

Não seria exagero dizer que foi a principal referência teórica de toda uma geração, que dos anos 1980 em diante, passou a se dedicar as artes eletrônicas e digitais. A história da videoarte brasileira (e internacional, também) passa por Arlindo Machado e seus textos e conferências pioneiras.

Pode parecer um clichê lembra-lo como um homem adiante de seu tempo. Mas, hoje, quando a cultura dos dados definitivamente ganhou o mundo, voltar aos seus textos escritos antes da problemática da fotografia digital se colocar, é revelador. 

Foi difícil para nós escrever um texto a quatro mãos para homenageá-lo. Decidimos fazer um pré-roteiro de uma homenagem.

Take 1

Paula Alzugaray conta que quando discutiam os campos de trabalho do artista enquanto documentarista, durante seu mestrado, do seu desprezo sobre a ideia da imagem como simulacro do real; da redução da imagem à condição de assombração, de presença imaterial.

[Olha para a câmera e diz:]

Ele já sabia, desde o desafiador A Ilusão Especular (1984), que a imagem não tem nada de ilusório, nem de especular, nem de inversão. É construção e afirmação, frente à dimensão invisível do cotidiano. Mais real que o real. Como a revelação/imaginação do cadáver na fotografia de Blow up. 

Take 2

Giselle Beiguelman fala que lembrou de um episódio muito emblemático de sua sagacidade. 

[Câmera desce as rampas do prédio novo da PUC-SP em direção à entrada da Rua Ministro Godoy. Voz em off]

Era 2002 e nós lecionávamos na PUC-SP. Ao saírmos do prédio, paramos em uma banca de um rapaz que vendia cópias de filmes históricos em DVD. O rapaz, ao ver Arlindo Machado, mostrou-se muito envaidecido em tê-lo entre seus clientes. Animado, abriu uma sacola e nos contou:

Não deixo à vista, mas para as pessoas mais especiais eu mostro: tenho uma série de palestras gravadas em vídeo aqui comigo. Era incrível: havia aulas do Professor Milton Santos, de ilustres internacionais, como o Foucault e Guattari e… do Arlindo Machado!

Arlindo ficou atônito: Mas como assim vocês pedem para gravar a aula e depois comercializam na rua?!

Ainda não existiam celulares com câmeras nessa época, nem muito menos o YouTube… As poucas pessoas que tinham uma câmera portátil de vídeo eram realmente muito raras. 

Então, encontrar um DVD com aulas gravadas na frente da Faculdade era de fato algo inusitado.

Tentei acalmar o Arlindo, comentando que ele deveria tomar aquilo como um elogio. Tão marcante eram suas aulas que já estavam sendo distribuídas para consumo “on demand”.

Ele ficou sério, pensou e acabou concluindo: Quer saber de uma coisa? Em breve, ninguém precisará mais disso. O professor mesmo gravará suas aulas e disponibilizará na Internet em algum serviço especializado para vídeo.

Mais uma vez, Arlindo acertou.

Take 3

Reler Arlindo, lembrar Arlindo, projetar Arlindo. 

 

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