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Postado em 06/03/2012 - 11:30
Desacerte os ponteiros
Giselle Beiguelman

Exposição de Gisela Motta e Leandro Lima desfaz obviedades para multiplicar sentidos

Anti-horário é o nome da exposição que a dupla Gisela Motta e Leandro Lima apresenta na Galeria Vermelho, em São Paulo de 06/03 a 05/04. Reúne um conjunto de obras recentes dos artistas, a maior parte delas inéditas.

A única já apresentada em São Paulo é Zero Hidrográfico, que esteve até bem pouco tempo no OK Center em Linz, na Áustria, e é até hoje, a única peça tridimensional criada pelos artistas.

“Apesar de ser um objeto, retoma o que sempre quisemos do vídeo: pensar o tempo em suspensão e também a repetição, o loop”, diz Leandro.

Espécie de mar de neon, de ondas remexidas por motores e dobradiças de gavetas que sobem e descem, é um híbrido de gambiolgia avançada com baixa tecnologia.

Esse tipo de estratégia, a combinação de elementos opostos em racionais exercícios de desprogramação de rotinas é um dos traços da produção de Lima e Motta.

Em várias obras, aparece na forma como os equipamentos são tomados para executar as mesmas funções para que foram projetados, porém não do modo como o fazem no cotidiano.

É o caso de Calar (2011), uma vídeo instalação duocanal feita com uma câmera termográfica.
Esse tipo de câmera mapeia, sem contato físico, os padrões térmicos da superfície de um objeto. É utilizada na indústria para teste de rigidez de partes de automóveis e até em aeroportos para investigar se os passageiros são saudáveis ou não.

Mas ao ser usada num jogo que revela a energia em forma de calor emitida pelos corpos, e que se transforma através do toque, ao mesmo tempo que sublinha exatamente o que já vinha prescrito no pacote pronto do dispositivo, o subverte de ponta a ponta.

E é nesse subversão que outras questões recorrentes na obra da dupla – afetividade, vida a dois, compartilhamento, erotismo, sexualidade, gênero, casamento, atração, repulsão, controle, resistência — se reposicionam e se rearticulam, retomando por outros ângulos, pontas de trabalhos como Segmento de Reta (2006), Você Para (2008), entre outros.

Impossível não deixar de notar, nesse contexto, que se existem continuidades na exposição, há várias novidades. Uma delas é a obra que dá título à mostra, Anti-horário, um vídeo circular em todos os sentidos e no qual emerge um terceiro elemento, o filho do casal.

Encantador, para dizer o mínimo, Anti-horário retrata a paisagem em torno das ruínas da antiga casa do faroleiro de Recife como se fosse o pano de fundo de um relógio de parede.

Nesse relógio, que é um verdadeiro poema de imagens, os adultos, o casal, são os ponteiros das horas e a criança, o dos minutos. A ruína parece andar para trás, os adultos parecem não sair do lugar e a criança, ligeira, mas sem andar retilíneo, vai, aos poucos ocupando o círculo e o centro da tela. Em torno de tudo, o movimento delicado das nuvens.

Entre as obras nunca antes expostas — Xabori, DNA e Captcha–destaca-se a última série. Ela é feita com frases retiradas do clássico da ficção científica 2001, Uma Odisséia no Espaço de A. C. Clarke, filmado por Stanley Kubrick, que encena o célebre embate entre o supercomputador HAL 9000 e a humanidade que acaba por dominar.

São justamente as frases emblemáticas da vitória da HAL sobre o homem que aparecem na série dos artistas. Porém essas frases aparecem grafadas na tipologia do padrão captcha.

Esse padrão é utilizado por quase todos os sistemas on-line para verificar se é realmente um ser humano quem está preenchendo o cadastro e não um script malicioso. “Hoje em dia tornou-se comum você ter que provar o tempo todo para seu computador que você é humano”, comenta Leandro.

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Legenda: Captcha, 2012 (Motta e Lima)

Em Captcha, as frases de HAL foram bordadas por máquinas industriais, simulando essa tipologia. Mas isso não sinaliza a vitória definitiva de HAL, até mesmo porque essa dicotomia perdeu o sentido. “O que importa é qual é a distinção entre as coisas – água, bordado, DNA — e como isso se torna vivo”, pontua Gisela.

Hora de desacertar os ponteiros e se abrir às ambiguidades.

Anti-horário (individual de Gisela Motta e Leandro Lima)
Abertura: 06 de março, 20h.
07/03 a 05/04
Galeria Vermelho