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Ana Cristina Cachola, Daniela Agostinho e Joana Mayer, investigadoras do coletivo Pipi Colonial (Foto: João Pedro Vale, Nuno Alexandre Ferreira)
Postado em 11/12/2017 - 6:20
Entre gênero e colonialidade
Inspirado pela teoria feminista, coletivo Pipi Colonial reflete sobre a herança colonial na atualidade

O Pipi Colonial (Ana Cristina Cachola, Daniela Agostinho e Joana Mayer) é um colectivo formado em 2016 que se expressa através da curadoria, da programação e da produção de pensamento crítico. O nome Pipi Colonial evoca a afinidade com outros coletivos feministas que operam no meio artístico (Pussy Riot, Pussy Galore, Fierce Pussy, COUNTess), em que questões de gênero continuam por discutir de forma consistente e informada. O objectivo do Pipi Colonial é problematizar a teia de relações entre gênero e colonialidade a partir de uma perspectiva feminista, sistêmica e interseccional. Quer isso dizer que o coletivo não se furta à complexidade de abordar essas questões a partir da posição do sujeito feminino, branco e europeu, reconhecendo assim a “dupla articulação” do colonial de que fala Homi Bhabha, isto é, uma condição que é partilhada entre colonizadores e colonizados, mas que tem legados e efeitos díspares para cada um. Inspirado pela teoria feminista, pós-colonial e descolonial, o coletivo investiga o imaginário histórico resultante dessa dupla articulação, indagando de que forma esses imaginários se encontram por via quer da tensão quer da convivialidade. O Pipi Colonial procura criar espaços de confluência solidária de agendas, aspirações e receios que reconhecem a multiplicidade de experiências de vários sujeitos, multiplicidade essa que é encarada como desejável e produtiva. O coletivo reflete assim sobre as linhas de continuidade entre formações coloniais, sobre o legado do passado colonial na contemporaneidade, nomeadamente as novas configurações de colonialidade capitalista e belicista, e sobre a forma como estas condicionam e se articulam através de categorias de gênero. Por fim, a atuação do Pipi Colonial explora a potencialidade epistêmica do curatorial, entendido como prática de produção de conhecimento para além do expositivo e do programático.

A coisa está preta
A primeira programação pública do Pipi, intitulada A Coisa Está Preta, foi concebida para o Bregas, espaço de programação independente fundado pelos artistas João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira em Xabregas, Lisboa. O programa era composto de uma exposição, projeção de filmes, um Peep Show Teórico – uma série de palestras em que foi dada “carta branca” aos convidados para falarem sobre o “preto” – e um DJset. Em A Coisa Está Preta explorou-se a tensão entre o festivo e o sombrio, em que a produtividade conceptual do preto surgia como signo, por um lado, da sombra dos traumas históricos que continuam a se perfilar no presente, da escravatura às novas formas de colonialidade capitalista, e, por outro, da energia subversiva das micro e macrorresistências (estéticas, políticas, éticas) que reconfiguram a matriz violenta do mundo.

Estudos noturnos
No âmbito da exposição Curated Curators II, organizada pela dupla de artistas Sara & André na Galeria Zaratan, em Lisboa, o Pipi Colonial forneceu um conjunto de fotografias, tiradas em contexto noturno, a Rita Ferreira, a partir das quais a artista produziu um álbum pictórico de Estudos Noturnos. Os Night Studies constituem um campo de produção de conhecimento cunhado pelo Pipi Colonial, campo que pretende resgatar o potencial da noturnidade, destacando as suas valências boêmias, de convivialidade, mas também a sua potência epistemológica. O Pipi Colonial acredita que sair à noite (da academia, da galeria ou do museu) permite que o conhecimento circule fora de espartilhos institucionais, expandindo as possibilidades epistêmicas do contemporâneo.

Agenda Pipi Colonial
Temos dois projetos agendados para novembro de 2017. Pipi Antro – feminismo e antropoceno, programa de conferências no âmbito do Fórum do Futuro (Câmara Municipal do Porto) com Denise Ferreira da Silva e Sophia Al-Maria, em torno do tema “Terra Eléctrica”, no Porto. E Efeito-suruba, programa curatorial, festivo e reflexivo sobre a promiscuidade da mídia e os media da promiscuidade na produção artística contemporânea, no espaço de programação sob direção artística do Teatro Praga, em Lisboa.