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Postado em 18/09/2015 - 9:02
Ficções reais
Ao reunir um conjunto de obras que prescindem da matéria, exposição evidencia os mecanismos de construção da realidade por meio da ilusão
Luciana Pareja Norbiato

Como o título sugere, as 18 obras que integram Imaterialidade são, sobretudo, propostas diáfanas. Visuais, sonoras, conceituais, até aéreas, todas são intangíveis em maior ou menor grau. Desde Raethro Green (1968), bloco verde fluorescente do norte-americano James Turrell – na verdade uma projeção de luz que dá a sensação de concretude – até a impressionante ilusão de ótica arquitetônica de Seção Diagonal (2008), de Marcius Galan, realçada na montagem pela inclinação do piso, passando pela delicadeza de O Ar Mais Próximo (1991), de Waltercio Caldas, que simula planos geométricos com fios de lã suspensos, frágil delimitação espacial à mercê do vento.

Difícil falar da exposição sem desejar citar todos os trabalhos. Escolhidos a dedo por Adon Peres e Ligia Canongia, traduzem a premissa curatorial com clareza, poesia e economia – grande mérito para um espaço expositivo tão pequeno que teve de contar com o reforço da área de convivência, único revés da concisão da mostra.

A exposição lembra a cena final de Blow Up (1966), de Michelangelo Antonioni, em que jovens jogam tênis sem bola nem raquetes. No jogo proposto de maneira particular em cada obra, os artistas escancaram o que se esconde em trabalhos calcados na materialidade: o fato de que a realidade é uma construção imaterial, dependente do aceite individual para valer. Paradoxalmente, deixando-se enganar pelos sentidos ou comprando a proposta de uma obra que depende de seu título para se fazer entender, o espectador é convidado a transcender a ilusão de uma realidade uniforme e factual imposta cotidianamente pelas várias instâncias culturais sobrepostas ao indivíduo.

Ao tomar parte no jogo fictício, como quem golpeia com uma raquete imaginária uma bola invisível, o público abandona o lugar de mero observador para não só completar internamente cada trabalho, mas, principalmente, perceber o desenrolar desse processo, desde a captação do estímulo sensível até sua formulação racional. Se é possível escolher no que se quer acreditar, por que não ser criador ativo das próprias ficções (reais), seja na arte, seja na vida?