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Postado em 28/08/2012 - 7:26
Hayao Miyazaki é tema de curso em São Paulo
Mariel Zasso

Confira a entrevista com Liliana Morais sobre a estética kawai e as marcas da cultura japonesa nos filmes do renomado diretor japonês

Tororo

Legenda: Meu Vizinho Totoro (1988), um dos primeiros animes de Miyazaki, é um bom exemplo da estética kawaii, palavra que pode ser traduzida por “fofinho” ou “bonitinho” em português. (Imagem: reprodução)

O Espaço Mizú , escola de arte no bairro da Pompéia, em São Paulo, vai abrir as portas, em dois fins de semana de setembro, para “Uma aventura pelos animes de Hayao Miyazaki”. Nos dias 15 e 16, 22 e 23 de setembro, o curso com a proposta de analisar diversos aspectos dos animes dirigidos pelo renomado diretor japonês promete atrair fãs do diretor e da estética kawai.

Sob coordenação da Professora Michiko Okano, o grupo de de estudos sobre as animações de Hayao Miyazaki, produzidas pelo Studio Ghibli, estudou, nos últimos dois anos, seus aspectos culturais, simbólicos e estéticos, e a relação entre o Japão e o Ocidente. O resultado dessa pesquisa foi formatado em um curso, que será ministrado pela primeira vez.

O entendimento da filmografia de Miyazaki passeia por temas como a figura feminina, o conceito kawaii, a tecnologia e a natureza, o mito, a memória e o sonho, a estética e a metamorfose, que serão analisados em uma aula introdutória panorâmica e mais dois módulos com quatro aulas cada, divididos em dois finais de semana.

Para entender melhor “que papo é esse”, entrevistamos Liliana Morais, mestranda em Estudos Japoneses pela USP, integrante do grupo de estudos, e, obviamente, fã de Miyazaki. O grupo completo é formado por Michiko Okano, Erika Kobayashi, Francisco Coutinho, Simonia Fukue, Fernando Saiki, André Maffioletti e Bassy Arcuschin Machado.

Mas fique esperto: o curso recebe inscrições somente até o dia 10 de setembro.

seLecT: Primeiramente, um pouco sobre nossa entrevistada: você veio para São Paulo para estudar a cultura japonesa?

Liliana: Bom, eu sou portuguesa e arqueóloga, vim para são Paulo em 2007, por amor e acabei me apaixonando pela cultura japonesa e pela transformação peculiar que ela sofre aqui no Brasil. Comecei a interessar-me muito pela cultura nipo-brasileira, por isso atualmente faço mestrado sobre mulheres ceramistas japonesas e descendentes no Brasil. São Paulo é um lugar rico para estudar a cultura japonesa, embora não possamos pensar que o que temos aqui é uma cultura japonesa “original”, igual à do Japão. Mas é isso que São Paulo tem de especial, essa mutação entre as várias culturas e transformação em algo novo, completamente inédito e muito peculiar.

Como surgiu a ideia de se reunir para estudar as animações de Hayao Miyazaki?

O grupo formou-se a partir de um curso de extensão da Universidade de São Paulo sobre a estética japonesa, ministrado pela Professora Michiko Okano, coordenadora do atual grupo de estudos sobre Miyazaki. Isso foi em 2009. Depois que o curso de estética terminou, para mantermos o contato, decidimos nos encontrar para assistir Ponyo, que tinha acabado de sair nos cinemas aqui no Brasil, e começamos a nos reunir em nossas casas para trocar nossas impressões sobre os vários filmes do Miyazaki. Esse encontro informal transformou-se em um grupo de estudo organizado, com lição de casa e tudo!

Desde então, formatamos o que queríamos estudar, cada um foi-se centrando em um tema e daí surgiu o curso. Algumas pessoas que participavam no começo acabaram saindo, mas também surgiram outras pessoas novas, inclusive uma moça que vem de Curitiba só para participar das reuniões de sextas-feiras à noite! Por isso costumamos brincar que só sobraram os mais nerds. Entre os integrantes, há profissionais de áreas variadas, mas todos compartilham uma paixão pela cultura japonesa! Temos pessoas da área das artes, como uma ilustradora (Simonia), um artista plástico especialista em xilogravura (Fernando) e uma arquiteta (Bassy), estudantes, da área de cultura japonesa, como eu, de literatura (Francisco) e de cinema (André) e até uma jornalista (Erika). E uma professora de história da arte da ásia, a Michiko Okano!

O que é a estética kawai?

Transcrevendo as palavras da Professora Michiko, que irá ministrar a palestra sobre a estética kawaii, é um “conceito correlacionado á celebração de estados adoráveis, inocentes, puros, simples, vulneráveis, frágeis e inexperientes”. Essa estética é muito presente nos filmes de Miyazaki, por exemplo, na representação das heroínas, como a Ponyo ou a Mei de “Totoro”. Basicamente, kawaii pode ser traduzido por “fofinho” ou “bonitinho” em português.

Quanto à representação da natureza nas animações do Miyazaki, que é o tema da sua aula no curso, o que você destacaria para nossos leitores?

A natureza é um dos temas centrais nas animações do Miyazaki. Apesar do diretor recusar a etiqueta “ambientalista”, essa mensagem ecológica é claramente transmitida em vários de seus filmes, como em “Nausicaa do Vale do Vento” ou “Princesa Mononoke”. Dentro desse tema, vou apresentar como a simbologia das árvores de folha persistente (árvores cujas folhas, ao contrário das caducas, não caem sazonalmente) é recorrente nos filmes do Miyazaki e como ela se associa ao xintoísmo, religião primitiva do Japão e também um elemento frequente na obra do diretor. Sei que sou suspeita para falar, mas é realmente um tema muito interessante e extremamente rico! Algumas cenas, que vou mostrar no curso, ainda me emocionam sempre que assisto…

Legenda: Kodama, pequenos espíritos que habitam as árvores sagradas de “Princesa Mononoke” (1998), são exemplos da presença do xintoísmo na obra de Myiazaki (Imagem: reprodução)

Para brasileiros que queiram assistir às animações com um olhar mais analítico quanto às diferenças das culturais orientais e ocidentais, quais as curiosidades que você destacaria, em aspectos gerais?

As diferenças entre o Oriente e o Ocidente em que nos vamos centrar são essencialmente históricas e culturais e referem-se a temas que atravessam todos os filmes, como a peculiaridade da religião xintoísta, ou o papel tradicional da mulher no Japão, ou ainda, o folclore e lendas japonesas. Acredito que Miyazaki tem um olhar muito peculiar sobre o mundo, bem japonês diria, e isso aparece em muitos aspetos ao longo de todos os seus filmes. Remetendo um pouco para o meu tema, por exemplo, vamos ver como o diretor tem uma visão nostálgica da cultura tradicional japonesa, devido à modernização e ocidentalização que o Japão sofreu na época do pós-guerra. Logo, em seus filmes, ele vai trazer muitas referências ao Japão antigo, tradicional, com sua cultura muito peculiar e próxima à natureza.

E quanto a sua experiência pessoal, como veio desembocar no estudo da cultura japonesa e dos animes?

O meu interesse pela cultura japonesa vem de muito tempo atrás, antes de eu vir para São Paulo até. Começou, com muitos da minha geração, durante a adolescência, ao assistir os animes que passavam na época na televisão e daí estendeu-se a outros aspetos da cultura nipônica. Mas foi quando vim para São Paulo que esse interesse cresceu exponencialmente e foi aqui também que tive oportunidade de conhecer muitas pessoas que me inspiraram a traçar o caminho que tracei até este momento. Um delas foi a Professora Michiko Okano, coordenadora do nosso grupo. Foi por ter freqüentado seu curso na USP que estou hoje estudando os animes de Miyazaki e outros aspetos da cultura japonesa.

E finalmente, qual é o seu Miyazaki favorito?

É muito difícil escolher um só filme e personagem, mas acho que os filmes “Totoro” e “Princesa Mononoke” são aqueles que me tocam mais profundamente. Quanto aos personagens, escolho a Mei de “Totoro”, o Totoro e o Gato Ônibus, claro, e o gatinho Jiji, do “Serviço de Entregas da Kiki”, porque adoro gatos pretos!

Serviço:

Uma aventura pelos animes de Hayao Miyazaki
Quando: 15 e 16; 22 e 23 de setembro de 2012, às 15:00
Onde: Espaço Mizú, Rua Coronel Melo de Oliveira, 658, Pompéia, São Paulo-SP
Quanto: R$ 270
Inscrições: Até 10 de setembro de 2012, pelo e-mail info@japanbrazilgroup.com ou pelo telefone (11) 5574-0045 (atendimento de segunda a sexta-feira das 9:00 às 18:00).

Tonari no Totoro