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Postado em 30/11/2012 - 6:44
Mandando a real
Cinco relançamentos colocam Philip K. Dick na ordem do dia: quando a ficção científica se tornou a literatura contemporânea?
Ronaldo Bressane

Ele pode não ter inventado o futuro, mas certamente criou muito do cinema que assistimos hoje. Nada menos que 20 produções foram inspiradas em romances ou histórias curtas de Philip Kindred Dick, ou PKD, como o chamam os iniciados na literatura desse que é considerado o mais influente escritor de ficção científica – dado que suas histórias cada vez mais se parecem com certos temas que vivemos hoje.

É que esse norte-americano de Chicago (1928-1982) não se satisfazia com os limites que muitas vezes travam a ficção científica em clichês usando viagens espaciais, robozinhos, teletransporte, gadgets milagrosos etc. A ficção de PKD fala de metafísica, estados alterados de percepção, busca por identidade, confronto entre sagrado e profano e, acima de tudo – nada mais contemporâneo do que isso –, o conflito entre o real e o virtual. Acima de todos os seus livros paira uma serpenteante sentença do próprio PKD: “Realidade é aquela coisa que, quando você para de acreditar nela, continua lá”.

Os Três Estigmas de Palmer Eldritch é um dos livros que a Aleph reedita em uma coleção agraciada com o belo design do paulistano Pedro Inoue, diretor de arte da revista canadense Adbusters. Nesse romance, o personagem título, para brigar no mercado com a droga Can-D – cujos efeitos são semelhantes aos da ayahuasca, do LSD ou de uma imersão prolongada na internet –, cria uma droga chamada Chew-Z, cujo slogan é “Deus promete vida eterna; nós cumprimos a promessa”.

No pacote está também Realidades Adaptadas, reunião de contos que inspiraram filmes como O Vingador do Futuro, Minority Report e O Pagamento, entre outros. Fluam, Minhas Lágrimas, Disse o Policial é a aterrorizante história de um astro pop planetário que um dia acorda totalmente anônimo. Ubik, uma comédia metafísica, é ambientado em um mundo onde os mortos são mantidos por seus parentes em uma “meia-vida” e podem até falar com eles – até que um acidente faz um desses mortos carregar pedaços do presente para o passado.

Por fim, na leva de lançamentos há o livro de PKD favorito de Jorge Luis Borges – um romance que não trata exatamente de ficção científica: O Homem do Castelo Alto. A premissa é que os EUA perderam a Segunda Guerra Mundial para o Eixo e foram fatiados entre Alemanha e Japão. Mas, lendo o I-Ching, um homem percebe que esta é uma realidade alternativa, e que a realidade verdadeira mora em outro lugar… Mesma sensação que se tem ao finalizar qualquer narrativa de Philip K. Dick.