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Postado em 29/01/2013 - 8:47
Morre mestre Walter Zanini
Angélica de Moraes

Uma das maiores personalidades da cultura brasileira, fundou e foi diretor do MAC-USP, além de devolver o prestígio internacional à Bienal de São Paulo

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Legenda: Walter Zanini em 1981, quando foi diretor da Bienal de São Paulo (Imagem: Acervo Histórico Fundação Bienal)

Este mês de janeiro está pesado de mortes. Agora levou Walter Zanini (1925-2013), nosso querido professor Zanini, um dos nomes fundamentais para a cultura visual brasileira, para a historiografia e a reflexão teórica da artemídia. Rigoroso e objetivo ao escrever, Zanini detestava adjetivos e metáforas. Impossível reprimir, no entanto, a idéia de compará-lo a uma daquelas enormes e frondosas árvores que, ao virem ao chão, deixam uma clareira no seu entorno, difícil de ser repovoada pela floresta. Porque Zanini era como um baobá, árvore rara, imensa, sólida. Alta e generosa na sua sombra, que abrigava muitos. Chega de adjetivos, porém. Vamos aos fatos, como o mestre ensinou.

Historiador e crítico de arte, Zanini fundou e foi primeio diretor do Museu de Arte Contemporânea da USP (1963-1978). Foi no MAC-USP que ele sintonizou o circuito artístico brasileiro com a videoarte e os novos meios, a então denominada arte eletrônica, abrindo espaço também para a livre experimentação artística e para a produção das novas gerações, que exibia na mostras Jovem Arte Contemporânea (JAC) e outras tantas que transformaram o museu em centro de encontro e debate da classe artística.

Zanini foi o nome procurado pela Fundação Bienal para restaurar o prestígio internacional da instituição, fragilizada pelos anos de chumbo da ditadura militar e da censura às obras de arte. Cumprindo à risca o desafio, instituiu e exerceu pela primeira vez no país o conceito de curadoria, fazendo duas bienais antológicas, a 16ª e 17ª edições (1981 e 1983), que inscreveram novamente o evento no calendário mundial de grandes mostras periódicas de arte contemporânea. Criou o conceito de analogia de linguagens para a distribuição das obras no espaço expositivo e desatrelou-a da representação por países, modelo herdado da bienal de Veneza. Tudo isso nessas duas bienais dos anos 1980. Legados tão fortes que alguns, em passado recente, tentaram lhe roubar a primazia dessas atitudes.

Entrevista

Legenda: Walter Zanini entrevistado por Cristina Freire no Manifesta Journal 11,
referência internacional em teoria e práticas de curadoria contemporânea

Na sua primeira bienal (1981), Zanini trouxe para o âmbito principal das artes visuais as obras realizadas com alguns dos novos meios artísticos da época, como a artexerox, o videotexto e a holografia. Não bastasse isso, foi autor e coordenador da monumental História Geral da Arte no Brasil (Ed. Instituto Walther Moreira Salles, 1983, 2 volumes), o maior esforço historiográfico jamais feito nesse setor e que ocupou equipe de 16 especialistas, entre eles o antropólogo Darcy Ribeiro.

Realizou centenas de exposições e organizou outros tantos catálogos, muitos deles livros de referência incontornável. Sua produção de textos, tanto para as revistas acadêmicas quanto para a imprensa, é extensa e importante, demarcando o exercício de uma crítica baseada em muita pesquisa e método, uma quebra de paradigma na crítica de arte da época, então ainda bastante confinada a conclusões de gabinete e compradrios.

A trajetória desse professor, que conjugava prestígio acadêmico internacional a uma calorosa popularidade entre os alunos, foi bastante singular para a época em que se iniciou. Graduou-se pela Université de Paris VIII em 1956 e obteve doutoramento pela mesma universidade em 1961. Professor titular de História da Arte da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), onde trabalhou até se aposentar, foi antes professor da mesma disciplina na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), onde coordenou uma equipe de professores que incluía nomes como Júlio Plaza e Regina Silveira. Zanini formou gerações de artistas e teóricos que atualmente contribuem de modo decisivo para consolidar a qualidade da produção artística brasileira.

Escreveu diversos livros importantes, entre eles Tendências da Escultura Moderna (Ed. Cultrix, SP, 1971). Foi traduzido para diversos idiomas, especialmente o italiano, o inglês e o francês. Deixa inédito um livro sobre a história da artemídia no Brasil, tarefa que o ocupou obsessivamente até seus últimos dias. Escreveu crítica de arte no jornal O Estado de S. Paulo e para a prestigiosa Leonardo, revista norteamericana de arte e tecnologia.