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Postado em 12/02/2012 - 12:36
Tendência é ser sustentável
Mariel Zasso

II Congresso Internacional de Inovação e Tecnologia discutiu moda, sustentabilidade e riqueza cultural brasileira

O limite entre o engajamento sincero e um discurso vazio que serve somente ao marketing é sutil, e torna delicadas questões como responsabilidade sócio-ambiental e comércio justo. Quando se trata de moda e design, a tensão é ainda mais incômoda – vide denúncias recentes sobre trabalho em condições degradantes que faz parte do esquema de produção a custos baixos do chamado fast fashion.

Nesse contexto, a promoção de um evento como o Congresso Internacional de Inovação e Tecnologia – e em especial o interesse em levar discussões sociais sérias a um universo que se confunde com a definição corrente de futilidade – é um ato corajoso.

O evento fez parte da programação do Inspiramais Verão 2013, salão de design e inovação em componentes que aconteceu em São Paulo, nos dias 8 e 9 de fevereiro, e que faz parte do calendário de eventos que institui, ou ao menos almeja instituir, tendências para setores de moda.

Por certo, o tom das discussões também foi dado pelos convidados. Entre eles, Chiara Gadaleta, consultora de “moda sustentável”, e Adélia Borges, jornalista, curadora e gestora cultural, especializada em design.

Mix By Brasil – sustentabilidade com estilo

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Legenda: Artesanato com consultoria de estilo, exibido na mostra Mix by Brasil. (Foto: divulgação)

A moda pode mudar vidas e ser um agente de transformação. Esse é o mote do movimento “Ser sustentável com estilo”, criado por Gadaleta. Para ela, a receita é simples: sem beleza, não há sustentabilidade. Tão importante quanto produzir seguindo os “eco-critérios” – comércio justo, reciclado/reciclável, orgânico, local, socialmente responsável – é vender.

“Há um preconceito contra os produtos ecológicos, e o consumidor de moda ainda associa o sustentável a ‘feio’, ‘mal acabado’, ‘desprezado’. Moda é graça, e todo mundo está disposto a investir em consumo sustentável, desde que não precise abrir mão do estilo.”

Em oito viagens a oito polos artesanais em diferentes cantos do Brasil –  Biriguí (SP) , Arinos(MG), Brás Pires (MG), São Leopoldo(RS), Recife (PE), Americanópolis e Paraisópolis (SP), Gadaleta e a equipe do Mix by Brasil investigaram o que as comunidades, na maioria das vezes carentes, produziam como artesanato.

As iniciativas foram mapeadas com auxílio do Sebrae, privilegiando projetos onde há aproveitamento de matéria-prima desprezada, como palha de milho, fibras de buriti, ou reutilização de materiais usados, como jornais, revistas e sobras de tecido. Nas visitas, além de conhecer o que cada comunidade já produzia, o grupo colaborou para pensar novos produtos e componentes mais inovadores, “estilosos”, e consequentemente mais rentáveis.

As comunidades passaram a ser tratadas como fornecedores de componentes, já simulando a relação comercial e o comprometimento que precisarão ter ao serem contratados. O resultado do investimento social foi apresentado no Salão Inspira Mais, que contou com uma feira do Mix by Brasil, além do Congresso Inovação e Tecnologia da Assintecal. 

A experiência foi transformadora para todos os envolvidos. “Nós fomos lá, sentamos no chão, colocamos a mão na massa”, relata Gadaleta. Foi um verdadeiro resgate cultural, que promoveu a auto-estima das comunidades, e incentivou os arranjos produtivos locais, fazendo a ponte que na maioria das vezes inexiste entre o consumidor – no caso, os fabricantes de calçados e acessórios – e os produtores artesãos. O resultado pôde ser visto também na feira, que exibiu inúmeras possibilidades de componentes criados com recursos alternativos.

Cultura nacional como commodity

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Legenda: Couro de peixe tingido é matéria-prima recente na fabricação de calçados (Foto: Mariel Zasso)

O reaproveitamento faz parte do DNA nacional. Em sua exposição sobre Design e sustentabilidade, Adélia Borges lembrou que no dia-a-dia dos brasileiros – “nossas mães e avós” – o reuso e a reciclagem são tradição popular – mesmo que a matéria-prima por aqui tenha sido sempre abundante. E ressalta que o Brasil se destaca quando o assunto é pesquisa com tecnologia e inovação em moda e design.

Em tempos em que “ser sustentável já não é opção”, o design de produtos incorpora essa caraterística como meta. E cria novos fetiches, que às vezes deslizam e acabam por subverter a lógica da reutilização para economia de materiais, criando, por exemplo, móveis feitos de madeiras novas que imitam madeiras de demolição.

Para Gadaleta, o Brasil precisa assumir a responsabilidade de ser um país com capital verde e capital humano e passar a valorizar sua diversidade cultural como possibilidade de agregar valor ao produto nacional, pensamento que, dentro desse universo, é novidade. “Faz pouco tempo que a moda é vista como cultura. Tudo o que estamos falando é tão antigo, tão simples… mas ao mesmo tempo é uma nova forma de pensar. Já não se fala mais em tendências, é preciso olhar pra dentro.”

Se for assim, tudo indica que ser socialmente justo e ecologicamente sustentável não apenas é possível como também é inevitável – e rentável. O que talvez nunca saibamos será qual a motivação de cada um que seguir esse caminho.

Para saber mais:

Ser Sustentável com Estilo – Chiara Gadaleta

Adélia Borges