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Frames da série de Stories compartilhada por Gustavo von Ha em seu perfil no Instagram @von_ha (Fotos: Cortesia do artista)
Postado em 01/05/2020 - 5:40
Vídeo de artista: As Stories do Brasil por Gustavo Von Ha
A partir de stories feitos durante a quarentena, o artista constroi uma experiência nas bordas da arte contemporânea
Larissa Macêdo

Em tempos de #fiqueemcasa, pandemia e contágios virais de toda ordem, o artista Gustavo von Ha (@von_ha) nos surpreende com uma série de vídeos compartilhados, inicialmente, em formato stories em seu perfil no Instagram.

Está cada vez mais claro que os stories são uma nova linguagem audiovisual, que atua como um vetor de ressignificação de linguagens e imagens online. Considerando o contexto da cultura do compartilhamento relacionada às plataformas digitais, essa nova linguagem possibilita novas formas de diálogo para artistas visuais experimentais, como @von_ha.

Mais do que nunca, as redes sociais são usadas como tentativa de compensar carências, lacunas e angústias relacionadas ao isolamento social presencial. A questão é: isso é possível? Ou estamos vendo um despertar dos artistas – e, por que não, das instituições de arte também – em relação às linguagens que essas redes colocam? Quais as possibilidades que esses recursos impulsionam para a criação de experiências e intervenções artísticas nessas comunidades online?

É nesse contexto de #coronavida – como bem define Giselle Beiguelman (@gbeiguelman) – que @von_ha compartilha micronarrativas nos stories, onde trata, de forma debochada e crítica, temas relevantes relacionados aos seus afetos e cotidiano da #quarentena

Nesses stories, Von Ha tensiona os limites entre realidade e ficção, misturando reportagens jornalísticas, cenas de novelas, fake news, memes, vinhetas de seriados e programas de TV, e trabalhos de outros artistas, para falar da realidade que estamos vivendo nesse período de incertezas e medos relacionados à pandemia e à situação política brasileira. As questões políticas que envolvem o (des)governo de @jairmessiabolsonaro são uma temática predominante na sua abordagem. Outras questões são os novos hábitos decorrentes do isolamento social, a demanda de mais produtividade e o consumismo relacionado a equipamentos de proteção individual 😷 (o capitalismo não descansa!). Não escapam desse vasto conjunto críticas ao sistema da arte e à forma com que os artistas estão sendo cobrados para produzir em diferentes plataformas e linguagens nesse momento. 

Os stories de @von_ha são recheados de referências atuais, dos anos 1970, 1980 e 1990. Alguns exemplos são: a presença do universo pop (com Rihanna, @badgalriri, e Michael Jackson, @michaeljackson), memes (como o @memedocaixao – um dos mais atuais e presentes nos vídeos disponíveis na seLecT TV) e vinhetas de televisão (como as séries Terra de Gigantes e Família Adams). A isso se conjugam cenas de novela (com os clássicos da personagem Carminha em @avenidabrasilglobo), além das referências ao universo gay e drag (como os stories recompartilhados da drag queen and gamer  @samiraclose). 

https://youtu.be/im7CEK2fr6E

@von_ha articula essas micronarrativas de forma que elas se assemelhem a programas de TV, funcionando como uma espécie de #CoronaShow pensado para o Instagram Stories. Apropriando-se dos recursos poéticos e estéticos dessa rede social, o artista evidencia a nova linguagem audiovisual que emerge aí e que tem a estética do compartilhamento e da contaminação como elementos vitais. 

Como Christine Mello (@chris.mello.2020) conceitua na sua abordagem das extremidades, o compartilhamento, como procedimento estético, viabiliza o mecanismo do contágio, ao mesmo tempo em que atua sobre a proliferação de sentidos. Podemos observar esse processo nesta série de @von_ha, já que o artista articula seus trabalhos em comunidades e linguagens de uma rede social, construindo uma experiência artística nas bordas da arte contemporânea.

@von_ha utiliza os recursos narrativos, de ordem estética e poética dos stories, como um meio de estabelecer locais de atração para o seu trabalho, relacionando interesses comuns de sua comunidade através dessas imagens online, com referências que se misturam em uma espécie de remix, que remetem à linguagem do videoclipe. É como se cada story de quinze segundos atuasse como um frame, que faz parte da experiência audiovisual em rede a que o artista nos convoca a participar. Sendo assim, cada vídeo de sua série tem em média 60 stories. 💡 Quando falamos de uma experiência estética nas redes sociais, não podemos esquecer que cada um pode construir a sua narrativa em diferentes temporalidades, já que é possível entrar em contato com os conteúdos compartilhados em momentos diferentes da postagem inicial.

Portanto, se partirmos do princípio de que cada story fica online por 24 horas, percebemos que o artista organiza também uma poética do efêmero. Ao construir sua própria linguagem nesses microvídeos, ele ativa um constructo ficcional que convoca o outro para o universo que gera com a rede.

Não é novidade que um dos hábitos que pegaram de vez na #quarentena foi o aumento do tempo dedicado às redes sociais, em especial ao @instagram. Um indicador desse fenômeno é que a plataforma pertencente ao conglomerado digital de @zuck (Mark Zuckenberg) registrou um aumento de 70% na realização de lives no formato stories no mês de março 😳 Além do, já conhecido, indicador planetário de 500 milhões de usuários ativos por dia no Instagram Stories

A vitalidade dos stories como fenômeno narrativo das redes aparece não só nos números, mas em novas plataformas, como o @tiktok, uma rede social chinesa baseada integralmente no formato de microvídeos de curta duração (15 a 60 segundos), e que está numa curva crescente de adesão, tendo ultrapassado  o Instagram em downloads no mundo. Ou seja, querides, os stories vieram para ficar, só não sabemos por quanto tempo 🤓, haja visto que esses apps pertencem a uma política hegemônica de grandes empresas tecnológicas mundiais que ditam e podem mudar as regras do jogo a qualquer momento. 

Pegando carona no meme que viralizou a partir de uma fala de Drauzio Varela, em uma entrevista para o Fantástico (@showdavida), em março: “Impressionante né, minha filha?” 

@von_ha é um artista múltiplo que se apresenta no seu perfil no Instagram  como “Visual artist based in Sao Paulo 🔥🇧🇷🖕🏽💥👻 Sou mais legal nos stories 🏽🌈️🌎. Concordo. Suas micronarrativas em stories são interessantes mesmo. E digo mais: são uma contribuição para as reflexões críticas de um momento em que as formas de ser e estar no mundo, a vida e a arte, estão sendo ressignificadas pela ação de um vírus (o corona), que contamina a todos com as mudanças que promove nas nossas macro e micropolíticas diárias. Traz a incerteza como padrão, sendo assim, como serão as próximas 24 horas? Não sei! Aguardo os próximos stories! 🏹

https://youtu.be/ASSwv8N-mA4

@larissacsmacedo (Larissa Macêdo) é crítica, professora, publicitária, pesquisadora, doutoranda e mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, onde desenvolveu a pesquisa “Poéticas do Efêmero: Novas Temporalidades em Rede a Partir do Instagram Stories”. É professora dos cursos de Comunicação Social do Centro Universitário Belas Artes (SP) e realiza palestras e cursos com temáticas voltadas para as redes sociais digitais, relacionadas às novas estéticas, às práticas sociais e aos modelos de produção artísticos e multimídia.